Desço
as escadas de pedra, estreitas, escarpadas, desgastadas pelo tempo. A cada
passo, rebola um calhau dos dezanove degraus que vão resistindo.
Atravesso
o pátio de recreio forrado a xisto e o alpendre coberto por um telheiro. Ali,
estão uma grande mesa rectangular rodeada de cadeiras, em plástico branco e uma
mesa de ping-pong.
No
assador e grelhador, construídos em tijolo, a um canto, estão pousadas as
raquetas e as bolas.
Entro
na casa pela kitchenette, equipada
com todos os utensílios indispensáveis domésticos. Da pequena cozinha, passo à
sala comum decorada com uma grande mesa de jantar, sofás, cadeirões, uma
mesinha central, um plasma e uma lareira.
Visito
a seguir os dois quartos de casal, o WC completo e o WC com duche e, por um
lance de escadas em ferro, subo ao apartamento menor onde assentam quatro camas
individuais.
É
este o alojamento rural, antiga escola primária adaptada a turismo campestre, onde
eu e alguns familiares, incluindo crianças, decidimos passar uma semana.
A
solidão é absoluta.
Na
vegetação selvagem, as poucas cigarras que rechinam temperam o silêncio. A
brisa nocturna é tropical e os crepúsculos são anunciados por um quarto
crescente nebuloso.
Os
olhos distendem-se por enormes planícies de terra batida, serranias e ravinas
arborizadas. O calor abafa. Mergulha-se nos rios e a pele arrepia-se com a água
gelada.
A
natureza é um mistério.
Encosta
abaixo, arruma-se o lugarejo, com um grupo pequeno de casas, a capela, o cemitério.
Os aldeões, mal o sol se põe, recolhem às suas camas. “Deitam-se com as
galinhas”. Um ou outro idoso aproveita os últimos momentos do dia e refresca-se
na soleira da porta.
No
meio do asfalto, há sempre o mesmo cão enroscado. Vigia enquanto dorme. A sua
mansidão contrasta com o som do sino ao badalar as orações vespertinas.
Não
deixo de pensar no contraste existente entre esta paz paradisíaca e o inferno
que se vive a quilómetros onde lavram incêndios que tudo devastam e onde a mão
criminosa tem muitas capas para sua defesa.
Todos
sabemos o que está por trás de tudo isto mas nada se faz. Porque se há um que
tem a coragem de desmascarar não encontra nenhuma solidariedade colaborante e
restringe-se ao sermão no deserto. O povo tem medo e continua a sofrer, ainda
por cima, grato pelos apoios. Irónico e triste!
Desviando
o olhar das labaredas e da fumarada que enegrece o horizonte, reclino-me numa
esteira e contemplo o céu cor de pérola, onde apenas brilha uma estrela… talvez
a da cauda da Ursa Menor.
E
agradeço a Deus, ao Universo, à magia da Terra-mater que o ser humano teima em
destruir, o maravilhoso dom de estar viva.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Violar os Direitos de Autor é crime de acordo com a lei 9610/98 e está previsto pelo artigo 184 do Código Penal.
Por isso NÃO COPIE nenhum artigo deste blogue ou parte dele, sem dar os devidos créditos da autoria e sem colocar o link da postagem.
Muito obrigada!