-
Eh! O Filo vem hoje com focinho de caso! Que aconteceu, Filo?
-
Nada! Diz antes o que não aconteceu…
-
Mau!... Então o que é que te não aconteceu?
-
Nada! Não aconteceu nada. Não acontece nada. Acho que vou fugir de casa.
Rissol
insistiu:
-
Que se passa, diz lá?
-
Quando apareceu a Televisão, as conversas em família desapareceram. Todos os
rostos dirigidos para o ecrã, afundados nos programas. De quando em quando, lá
surgia um comentário ou outro. Se eram filmes a horas tardias, adormeciam no
sofá, uns para cada lado.
-
Mas depois a tecnologia avançou, veio a TV a cores…- interrompeu o Rubi.
-
Espera! E as gravações, as operadoras com os seus pacotes convidativos e as playstations, as consolas, os
infindáveis jogos… tudo muito bonito para os miúdos não chatearem. Cada criança
fecha-se no seu quarto e permanece horas a fio obcecada pela Internet, pelos Facebooks, pelos joguinhos… resultado,
vês uma casa de quatro ou cinco elementos, cada um para seu lado, enfiados cada
um no seu quarto. Às refeições, como têm horários desfasados do trabalho e das
aulas, nem se encontram. Quando há oportunidade de estarem juntos e desabafarem
os seus problemas, cada um refugia-se em si mesmo e nas suas obsessões. E
eu?... Incrivelmente solitário!
Jimmy
apaziguou-o.
-
Fugir não te aconselho. O mundo lá fora não é convidativo. Passas a dormir ao
relento, a chafurdar nos caixotes, a levar pontapés…
-
Apoiado! – disseram os outros em coro.
-
Pois! Vocês acomodaram-se.
A
Lulu aventurou:
-
Querem mudar de conversa? Uma discussão acesa entre os meus donos são os cortes
e a austeridade.
-
Oh! Oh! Não venhas com essa! Há agregados familiares que não têm que dar de
comer aos filhos e onde é que estão os cortes nos ordenados chorudos dos
políticos? E dos elementos do Governo? Com viagens pagas, ajudas de custos,
carros top gama…
-
O pior é a informação televisiva. Dá uma reportagem sobre famílias a viverem
abaixo do limiar da pobreza e logo a seguir um programa sobre o master chefe ou
a gastronomia regional. Um insulto!
-
Podes ter razão mas os necessitados não vêem televisão. Já a venderam para
comer.
-
Anda tudo descontente mas alguém se mexe?
-
Para quê mudar? São todos iguais. Vão magros para o poder, vêm de lá gordos.
Saem com reformas gordas, pensões vitalícias, subsídios inventados e alguns com
galardões.
-
A oposição… - adiantou o Filo.
-
A oposição, a oposição, o quê? Só sabe ser do contra. E ser do contra é dizer
mal. Que medidas sugerem?
-
O que eu sei – afirmou Rissol – é que está tudo por fazer neste país. Com o
sistema anterior vinha aí o comboio da TGV e não sei que outras ideias
megalómanas…
-
Os submarinos…
-
Bem… sempre davam nas vistas.
-
E estes?
-
Então… professores por colocar, o caos nos tribunais…
-
Caos, não. Colapso!
-
Olha que se for cardíaco, é pior.
-
Matas por limpar…
-
Livra! Nem o que é meu. Pago logo multa.
Os
cinco canitos ergueram-se a uma voz:
-
Vamos embora!
Entreolharam-se,
obedientes.
Lulu
rosnou.
E
Rubi arrematou:
-
Refilas mas acomodas-te.
-
Esqueces que sou de raça lusitana?
Sem comentários:
Enviar um comentário
Violar os Direitos de Autor é crime de acordo com a lei 9610/98 e está previsto pelo artigo 184 do Código Penal.
Por isso NÃO COPIE nenhum artigo deste blogue ou parte dele, sem dar os devidos créditos da autoria e sem colocar o link da postagem.
Muito obrigada!