sexta-feira, 26 de setembro de 2014

ENCONTRO DE CANICHES III


- Meninos! Trago notícias fresquinhas… - saudou o Gigi.
- A demissão do Governo. – lançou o Rissol.
- Isso é que era doce. – tornou o Gigi.- Então a receita aumenta e a despesa também, julgas que eles dão a mão à palmatória? Têm que justificar o défice…
- Mas que notícias fresquinhas são essas? – perguntou o Jimmy.
- Vai ser promulgada uma lei que sanciona os donos de animais de companhia que os abandonam. E se querem férias, devem salvaguardar o nosso bem-estar. – informou o Gigi.
Filo abespinhou-se:
- Não resulta. Eles arranjam sempre forma de se escaparem, de se livrarem de multas pesadas. Arranjarão sempre maneira de se descartarem de nós, fazendo desaparecer a nossa identidade. Rissol, não dizes nada?
- O ser humano é das existências mais ignorantes que se possa imaginar. O que descobre… o que descobre, sim, porque inventar não inventa nada, é tudo para acabar em seu prejuízo.
- Não é bem assim… - discordou Filo.
- Não? Tudo o que aparece de novo, é usado até à exaustão, Um flagelo. Por exemplo, os telemóveis. Provocaram a epidemia da “telemovite”.
Lulu riu.
- Ris-te?
- Rio. Vai ser aplicada uma taxa…
- Isso é como os cigarros. Quanto mais aumentam de preço, mais se vendem.
- Por falar em tabaco, lá em casa deu entrada triunfal a seringa eletrónica.-
Lulu coçou a orelha e ouviu a reprimenda da dona:
- Quieta, Lulu. A menina tomou banho!
- Viram? – queixou-se Lulu. – Connosco é tudo imperdoável. Vais a alguma passagem de modelos?
Jimmy mudou de posição.
- Vocês têm razão mas há uma coisa que eu julgo insuportável.
- O quê? – perguntaram todos à uma.
-O barulho.
- O barulho?
- Sim. A juventude só sabe gritar. Os rapazes e raparigas nos espetáculos musicais de que são adeptos, berram como endemoninhados, perdem as estribeiras, bebem álcool, consomem…pobre mocidade…com uma vida tão risonha pela frente…
- Risonha? Em que planeta é que vives?
- Gigi interrompeu:
Temos de ter esperança…
- Em quê? Em quem?
- Em ti próprio? E mesmo que a tenhas, se não procurares outros horizontes, bem que podes dizer adeus aos teus sonhos.
A afirmação saíra da boca de Filo.
- Em que pensas, Rubi?

A pergunta surgira de Jimmy.
- No caos em que está este país. Vejam só: Milhares de professores por empregar, turmas sem professores. Encerramento de tribunais, inevitável estagnação dos processos. Redução dos centros e serviços de saúde, volume maior de utentes, falta de médicos e enfermeiros…
- Estes vão para fora onde têm melhores condições de futuro… - interpôs Gigi.
- Continuando, o sector das pescas, artesanal e sem progresso, nem falam em reforma, como deixaram cair a reforma agrária, como se estão nas tintas para os estivadores, como se abandonou a perspetiva de reabrir estaleiros… Não há dinheiro.
- Não há? – admirou-se Rubi. Só ouço falar em milhões!
- A colheita dos milhões resulta da fraude fiscal e dos cortes.
O juízo foi do Rissol que terminou:
- As sindicais bem se esforçam… mas não vencem. É tudo fogo-fátuo.
- No outro regime, um só, com todas as pastas e vê se a crise fez assim feridas… quando a houve.
- Porque o povo consumia menos. Também houve racionamento.
- Eu acho que a crise é um disfarce! – replicou o Filo.
- Para quê?
- Para uns encherem os bolsos à custa dos bolsos vazios dos outros.
Jimmy mudou de conversa.
- Lá em casa só se fala nas “primárias”. Em qual dos dois recaem as vossas simpatias?
- Para mim… nenhum dos dois. São ambos gordinhos. – opinou a Lulu.
- Pois lá em casa, a prioridade é comprar a nova “consola” ao catraio para que os deixe em paz. – objetou o Rubi.
- A tua dona não é empregada pois não?
- Achas?... Se o marido tem três…
- Se assim é…
- E quando ele sair do Governo, ainda arranja mais um!
- Céus! Quanto valem os estudos… - lastimou-se o Rissol.
- Eu diria, quanto vale a esperteza, a argúcia de cada um, no jogo do gato e rato.
Rubi suspirou.

- Vêm amanhã? – quis saber Jimmy.
- Não! – respondeu Gigi por eles todos. – Vai ter lugar um chá de caridade e nós não podemos estar presentes.
- Caridade?... Caridade por quem?
- Então…
Gigi estava embaraçado.
- Então, têm oportunidade de mostrar o novo vestido. as novas jóias, o contributo, o estatuto conjugal…
- E isso é caridade?
Filo interrompeu:
-Pois! Há sempre uma que diz com voz de falsete: Este vestido… querida, …hi! Já o tenho há que séculos!
- E todos fingimos e todos respiramos aliviados.
- E o dinheiro conseguido? Sim, porque as entradas e a despesa…
- Isso, vai para o “orçamento retificativo”. Bye-bye!

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