6 de Janeiro de 2013
Aurora Tondela
Como o Natal pertence às
crianças, os festejos foram para mim durante a minha infância.
Eu acreditava em tudo com muita
alegria e alvoroço.
Assim é que na véspera de Reis eu
ia com o meu pai esperar os três monarcas.
Como muita gente, postávamo-nos
numa extremidade da ponte que liga a Figueira da Foz ao bairro de pescadores
chamado Gala e ao exterior da cidade, numa das margens do rio Mondego.
Lembro que a noite enregelava mas
a minha excitação era grande.
Quando a multidão começou a
mexer-se, percebi um rumor na entrada da ponte e luzes que se agitavam
ocultando os vultos negros que se confundiam com a noite.
Perto de mim, pude ver os camelos
e os três régios personagens, ricamente ajaezados, seguidos por uma brilhante
comitiva em que predominavam os cofres ornamentados co ferragens que
coruscavam.
Seguimo-los a uma certa
distância, a meu pedido, que não despregava a pupila ávida, encantada com o
cortejo e com todo aquele aparato.
Suas Majestades circularam pela
rua principal até desaparecerem pelas traseiras de um antigo edifício,
destinado a espetáculos.
Lá dentro, um espaçoso salão
iluminado, repleto com uma farta e tumultuosa assistência, olhava na sua frente
onde um palco fechado por um grosso reposteiro que prometia para mim, lendárias
surpresas.
Fez-se de repente silêncio com as
pancadas de Molière. O cenário abriu-se. Ali estava a gruta com a Sagrada
Família. Depois foram passando figurantes com as suas ofertas, jograis que
preenchiam os intervalos com éclogas e melopeias, tudo um pouco rústico,
improvisado, até que os dois soberanos de pele oriental e o outro de cútis
negra fizeram a sua aparição. Traziam ouro, incenso e mirra.
Só muito mais tarde vim a saber
que este último presente simbolizava a condenação…
…”e um menino nos nasceu”…
Tinham-no anunciado os profetas…
Regozijavam-se os judeus Jesus, o
Rei dos reis, o Salvador do mundo…
Belchior, Gaspar e Baltasar,
voltai por outro caminho. Não digais nada a Herodes!
O Ouro
Perante vos, Senhora, eu me
ajoelho.
Transporto no meu cofre, ouro e
prata.
Meus olhos lançam risos em
cascata;
tem meu peito um cristal, brilha
de espelho.
Meu coração em rios se dilata.
Sinto-me novo nesta pele de
velho.
Vejo o horizonte como um sol
vermelho
desta suprema aurora que
arrebata.
A vossos pés deponho o meu
presente.
Nada tenho que vos conforte a
mente
neste mistério que se esconde
ainda.
Ao meu reino regressarei feliz.
Este milagre que eu ver sempre
quis,
guarda a surpresa da Verdade
infinda
O Incenso
Venho de muito longe, do Oriente.
Foi para Vós que reservei o
incenso.
Parece-me, Senhor, que neste
imenso
mar de contendas, estareis
presente.
Mas agora dormis suavemente,
enquanto deste emaranhado e denso
mundo de provação a que pertenço,
Vos quedareis ausente e inocente.
Senhor, de Vós me aparto de
mansinho.
Levo comigo a imagem deste linho
que, para sempre, em mim, fica
retida.
Eis a boa nova que esperava
tanto.
Quisera saudar com alto canto,
as bênçãos que trazeis, o dom da
Vida.
A Mirra
Que pensais vós com esse triste
olhar?
Glória a Deus nas alturas! Glória
a Deus!
Que radiosa ventura aquece os
céus?
E vós… que pareceis que ides
chorar?
A Teus pés deposito os meus troféus.
Minha alma exulta sem poder
parar.
Com muita angústia Te direi
adeus.
À minha terra tenho de voltar.
De alegria, minha alma desfalece,
porque nesta hora extrema algo
acontece
que ficará gravado em pergaminho.
E grandioso é o Teu destino,
mau grado o sofrimento peregrino
com que nos indicas o Caminho.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Violar os Direitos de Autor é crime de acordo com a lei 9610/98 e está previsto pelo artigo 184 do Código Penal.
Por isso NÃO COPIE nenhum artigo deste blogue ou parte dele, sem dar os devidos créditos da autoria e sem colocar o link da postagem.
Muito obrigada!