Crónicas do Ano Novo
2013 - Para Onde Vamos?
Aurora Tondela
Viramos mais uma folha do
calendário. E o percurso de desilusões e pequenos sorrisos estabelece mais uma
meta na atribulada existência humana.
Numa época continuadamente
conturbada como é a nossa, não há lugar para grandes alegrias, especialmente
aquelas que são oriundas de afetos alicerçados em valores que o pensamento
convencionou de morais mas que absurdamente vem pervertendo.
A confusão é enorme. E no meio
dela, gera-se um profundo mal-estar geral, uma sensação terrível e ignominiosa,
intensificada pela persistência de factos que provocámos e a que nos
associamos, gritando sem nexo.
Como bons portugueses, os atos
não correspondem às palavras. Já dizia Eça de Queirós. E vozes de burro não chegam
ao céu.
Como pode o homem estar
satisfeito consigo próprio?
Que parcela de bom solidário
motivou para os outros? Que fresta da janela abriu para clarificar as mentes
obstruídas? eu mão estendeu sem que a outra soubesse?
Temos a resposta nas catástrofes
universais. As que minam a natureza revoltada e as que destroem as famílias,
afogando a voz da razão, vitoriando ambições de longa estirpe como afirmação
potencial do seu egoísmo e da sua indiferença, da sua frieza perante as
desigualdades.
Ninguém pode rejeitar a complexa
nitidez da maldade humana que vem rasgando as entranhas da humanidade. Se
ninguém a pode calar, esta não deve calar-se. Deve denunciar os seus lamentos e
não chorar em silêncio. Deve acusar os erros atrozes que se têm vindo a cometer
à luz de uma pseudo liberdade que aprisiona a liberdade do povo e duma nefasta
liberalidade de conceitos que apenas beneficia os poderosos e os corruptos.
Do que resulta um ostensivo e
progressivo torpor abstencionista das estruturas psíquicas que tornam os cidadãos
moralmente impermeáveis e as criaturas, vítimas da ferocidade dos interesses
inconfessos.
A quem podemos exigir explicações
do que se vai passando pelo mundo senão a nós próprios e a cada um de nós?
Vivemos o dia a dia no corrupio
incessante de cumprir obrigações que já nem chegam para conseguir um produto de
trabalho que dê para comer, vestir, educar os filhos. Foi-se a margem da
cultura, das diversões, dos horários justos.
Se os pais não dialogam com os
filhos, também os patrões não o fazem com os seus colaboradores, equilibrando
plataformas sentimentais.
Por que se não criam
oportunidades para conhecimento recíproco, salvo aquele gerado pelas
aparências?
Pensam então ilibar as suas
responsabilidades, criticando atitudes com mais largo propósito e autoridade,
sem ligações impróprias.
A democracia não acabou com as
classes.
Quem prevarica tem de crescer,
aprender com os seus erros. E sintam bem o vínculo da punição da sociedade que
no exterior revela os mesmos anseios e peca pelos mesmos dissabores.
Mas que sociedade?
Aquela que exibe fachadas
terapeutas?
Aquela que denuncia na penumbra,
de forma compulsiva, o que não interessa que se saiba e se discuta?
Aquela que sobrepõe a análise dos escrutínios
às intenções e projetos apregoados? Aquela que escuta os canais de informação e
suspira, penalizada? Aquela que grita nas ruas, arrastada pelas forças de
choque? Aquela que despreza a natureza do seu semelhante, a sua própria e a
natureza que o envolve substituindo-as pela sua desordenada comodidade? Aquela
que dá ao pobre a esmola do rico como se nesse gesto queira conquistar a paz da
sua consciência? Aquela que se aturde e atrofia em crenças estereotipadas, na
esperança de que lhe venha pousar na palma da mão, o fruto daquilo que não
semeou? Aquela que enxerta por intimidação, os caules que não conhece e se
regula por entusiasmos pueris, forjados na ignorância? Aquela que afasta a
cortina e perscruta o horizonte, confundindo o conforto da sua lareira com o
mindo em guerra, os corpos trucidados e violentados, as calamidades da fome, da
indigência, das epidemias, todo um caudal de desgraças que constituem a loucura
dos séculos e destroçam a dignidade humana, esfarrapando os costumes, a
inteligência e utilidade do progresso e o sentimento individual?
Por isso, se enevoa cada vez mais
a visão estimulada para a conquista das verdadeiras causas, aquelas que têm
como tema, a paz, a saúde e a prosperidade.
Por isso, se avolumam cada vez
mais as causas perdidas, que não desprezam a ganância, o egocentrismo e a ideia
corrupta.
Por isso, o medo se instala
naqueles que se restringem ao passado, na perspetiva de conseguir soluções para
as suas dificuldades, com base na experiência histórica.
Por isso, o presente é caótico e
nos atropelamos uns aos outros
Por isso, o futuro nem se
vislumbra.
Por isso, me interrogo e me
perturbam o caminho e o fim que pretendemos atingir…
…se é que queremos atingir algum
fim…
E isto se queremos viver e não
andar no mundo por ver andar os outros.
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